sábado, 28 de junho de 2025

O outro lado da cidade (maravilhosa?)

Ontem o boy aqui, botou os pés na Zona Norte. Fui a Madureira, tentar remediar um golpe aplicado por instituição bancária - a única agência na cidade está lá - no meu salário de aposentado.

Preocupado com minha segurança, coloquei roupas simples e discretas, tentando disfarçar o máximo possível minha condição de forasteiro potencializada pela minha cara de gringo. E lá fui eu de metrô para a Central. Peguei o trem para Japeri; os carros tinham ares de abandono externo, mas eram muito bem cuidados internamente. Pouca gente - eram 8:30h pois o destino ficava no contrafluxo. Bem diferente dos trens superlotados mostrados nos jornais televisivos. Ao longo do trajeto, muitas casas simples e na sua maioria, pouco cuidadas, geralmente de dois andares; atentei para o fato de haver pichação em  muitas delas. Treze estações depois de uma viagem sem percalços, desembarco em Madureira. 

Para sair da estação de trem e alcançar a rua, enfrenta-se duas longas escadas e um corredor atopetado de barracas de ambulantes. Nada de escadas rolantes. Ví idosos subindo e descendo por elas penosamente. Nas ruas de calçadas estreitas, muita gente,  vestida simplesmente; a maioria pardos e pretos.

A agência bancária estava próxima, e com uma razoável fila para o atendimento, composta por muitos idosos - possivelmente aposentados - de condição muito simples. As histórias que ouvi, dos que  estavam próximos, deixava transparecer a condição precária das suas vidas, tanto físicas quanto monetárias. Vinham de outros bairros, um deles com problemas de coluna, tinha dificuldade para ficar de pé.   Todos com histórias de dívidas e empréstimos, contraídos sei lá com que cláusulas, pela instituição bancária que,  se tinha aplicado um golpe em alguém da minha condição, imagina o que poderia ter aprontado pra cima  desse pessoal. Senti a grandeza do meu privilégio,  num país multifacetado como o nosso, vendo aqueles rostos vincados pela dureza da vida, potencializada por suas condições financeiras. Ouvi poucas queixas. Por incrível que pareça, observei um tom de resignação e até mesmo de  aceitação da sua condição. 

Já no interior da agência, aguardava minha vez sentado numa das muitas cadeiras que acomodavam aquele resignado exército Brancaleone. Volta e meia aparecia um funcionário sorridente e com uma gentileza afetada, oferecendo um cafezinho bem quente. Parecia deboche, e era!  Não faltou o toque evangélico. Lá pelas tantas alguém ergue uma Bíblia e entoa um  - Glória a Deus!

Fui atendido depois de uma hora - tempo razoável dentro das circunstâncias! - e voltei para a minha condição privilegiada como morador da Zona Sul prometendo retornar para uma visita ao Mercadão de Madureira, um velho sonho. Deram-me uma dicas de como chegar lá. Dá para ir caminhando a partir da estação de trem e isso me deu ânimo para uma nova visita ao outro lado da cidade. Talvez mais raiz daquele em que habito.




quarta-feira, 25 de junho de 2025

Vivendo o seu sonho.

Foi argumento frequentemente utilizado para justificar a aventura da moça de Niterói que morreu tragicamente na Indonésia ontem. Comumente utilizado quando se questiona os riscos envolvidos na aventura e o conhecimento a respeito deles pelas pessoas decididas a fazê-la. Todos são unânimes em afirmar de que se trata de uma trilha com grau de dificuldade elevado, não apenas pela geografia do terreno, mas também das condições de clima, preparo dos guias, além da falta de informação ou falsa informação a respeito da aventura. Prefere-se, entretanto, jogar prá baixo do tapete as verdades inconvenientes e louvar o espírito aventureiro daqueles que o fazem.

Viver o seu sonho fica bem na boca de um adolescente, mas na boca de um adulto, de um educador deveria ser sempre seguida de uma adversativa. Tentar realizar um sonho sem estar equipado para alcançá-lo ou quando as condições são francamente adversas é temerário e pode ser fonte de frustrações, quando não de tragédias. Para cada João Carlos Martins -  pianista e maestro que hoje completa 85 anos e um dos maiores intérpretes de Bach no mundo, e que chegou lá mesmo após ter perdido o movimento das mãos devido a uma doença rara - quantos ficam pelo caminho? 

Entretanto, argumentar com o viver o seu sonho,  vai te dar um carimbo de cara legal, otimista, que acredita na força do ser humano, além de elevar teu conceito no círculo engagé. Difícil é pontuar os riscos da aventura, posição mais responsável e adulta. Entretanto, vivemos em um mundo infantilizado como pontuou Amós Oz em uma entrevista para a Folha .

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Uma pessoa próxima tem uma filha que deseja ser médica e já se foram  3 anos tentando passar em vestibular de universidade pública sem sucesso. Universidade paga não pode cursar,  porque implicaria em investimento financeiro que a família teria dificuldade para custear. E aí...vai continuar a viver o seu sonho já tendo perdido  anos de vida profissional?

segunda-feira, 16 de junho de 2025

Quero desconhecer gente que já conheço.

Sei lá se é a velhice, mas cresce em mim o desejo de ficar em casa, com meus livros, minhas comidas, meus vinhos. Estou repetindo minha mãe que sempre dizia que ficava bem em casa, no seu arrevesado dialeto, mescla de italiano falado no Trentino-Alto Adige e português. Até meu pai, mais sociável, na sua velhice, preferia a traquilidade do lar. Gostava de receber os netos, mas quando eles iam embora dizia: - Graças a Deus! Maior seu avanço nos anos, menor sua tolerância para com a agitação.  

Com tal genética, eu fui além. Antissocial-raiz, quero desconhecer gente que já conheço, como escreveu Lusa Silvestre na sua coluna do Estadão. Interagir com os outros, cada vez mais, torna-se uma agonia. Repetindo minha mãe:

- Fico bem em casa.

quinta-feira, 12 de junho de 2025

...mais anos 60, impossivel!

 Paul McCartney afirmou em 1974 que God Only Knows foi a maior música pop já escrita. Deve ter sido um arroubo do momento, mas que ela exala o aroma dos sixties e de um mundo que parecia se abrir,  ah... isso é!


... e existe essa deliciosa versão da BBC, com muitos figurões do rock/pop e apenas Brian Wilson dos Beach Boys.



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In memoriam  a Brian Wilson (1942-2025).
Caramba! Todos estão a se ir...


Algo e/ou alguém está fora de lugar

O algo descrevo abaixo;  o alguém, per supuesto soy yo. Não sei se estou  sendo atropelado pelo tempo, ou se certas manifestações/comportamentos  sociais que observo por aqui,  estão ultrapassando todas as medidas do que é razoável e lógico para os arquétipos que construi ao longo da vida. O fato é que ultrapassam minha compreensão.

... e vamos aos fatos.

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MC Poze do Rodo (!?!), é um funkeiro carioca com mais de 15 milhões de seguidores.  Foi preso,  acusado de apologia ao tráfico e envolvimento com o Comando Vermelho - e solto uma semana depois através de habeas-corpus. Sua soltura provocou tumulto em frente ao  Complexo de Gericinó, com ônibus tomados pela multidão e a polícia tendo que atuar com spray de pimenta, gás lacrimogênio, cassetete e Batalhão de Choque para conter a confusão. 

Apoteose para MC Poze do Rodo - (Vitor Chapetta/Agnews)

Em cima de um deles, para dar as boas-vindas ao nosso herói,  outra grande figura do pedaço, o rapper Oruam - o filho do dono, como ele mesmo se define em uma de suas letras. O dono é Marcinho VP, chefe do Comando Vermelho condenado a 44 anos de prisão por assassinato, associação ao tráfico e formação de quadrilha. Cumpre pena na prisão de segurança máxima de Catanduvas-SP. O filhote que  já pegou cana  por duas vezes, tem 8,7 milhões de seguidores no Instagram e teve hit no topo das paradas do Spotify por 20 dias, dos 61 em que esteve disponível. Já cantou no Rock in Rio e no Lolapalooza, onde vestia uma camiseta com a foto do dono e a palavra Liberdade.

Sinistro (no sentido literal) o nosso Oruam.

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Apreciem a excelência das  letras de alguns de seus hits, com claro apelo sexual e  apologia ao crime:

Rolé na favela de nave,

 o som no último volume,

 vou brotar no baile mais tarde, 

vou usar um lança perfume,

 botar a Glock pra dar um rolé pras piranha vê um volume,

 é que na selva do urso sabe que nós é o assunto

(Rolé na Favela de Nave - Oruam)

O Estado é genocida com o morador. 

Não tenho medo, eu sou filho do dono.

 Maior responsa de sujeito homem, 

de carro bicho eu fiz ela endoidar.

 E hoje onde eu passo todas quer me dar.

(Oruam)

Oi, na VK os menor te acerta/

Só soldado bom de guerra/

Que te mira e não te erra/

Só AKzão na favela/

Com vários pentão reserva/

Aonde entrar, cês leva(...)

É bala nos três cu, é bala nos três cu/

De 62 é só papum e os alemão aqui nem tenta/

De Glock e de radin, fumando um baseadin/

Destrava o G3zão que se piar, nós quebra.

(Poze do Rodo) 

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De acordo com o G1, os fãs de Oruam são um público jovem de todas as classes sociais, que gostam de ver ostentação de marcas, de carros, de motos, jóias. Pois é... ambos são filhos de comunidades - Poze nasceu na favela do Rodo, em Santa Cruz; Oruam na Cidade de Deus, mas hoje o primeiro mora em condomínio de luxo no Recreio dos Bandeirantes, o segundo em uma mansão no Joá. Aliás, hoje vi no UOL  uma foto de Oruam curtindo a Itália com a noiva de acordo com a manchete. Noivaram em Paris, aos pés da Torre Eiffel. É a Cidade de Deus conectada com a Cidade do Papa, a Cidade Luz...

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Não é caldo prá pirar a cabeça de qualquer um? 





segunda-feira, 9 de junho de 2025

... e tudo bem!

Acabo de saber que no dia 2 de junho foi comemorado o dia da Acompanhante, eufemismo para o dia internacional da Prostituta ou da Trabalhadora Sexual. Hoje temos dia comemorativo para tudo, mais do que justo que a profissão mais velha do mundo receba a homenagem. Os tempos são propícios; vender o corpo deixou de ser hoje, atividade que cause pruridos morais;  há até sites de acompanhantes fazendo publicidade na capa de jornalões como a Folha, ou mesmo patrocinando clubes esportivos. 

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Quem sabe num futuro próximo, apareça um curso para formação de profissionais na arte. A palavra de ordem agora é movimentar a economia.

sábado, 7 de junho de 2025

Simon

S de solteiro;

I de imaturo;

M de materialista;

O de obcecado ( pelo sucesso...);

N de narcisista;

Acrônimo que define uma síndrome que afeta o gênero masculino com mais de 30 anos nos dias atuais. Foi definida pelo psiquiatra espanhol Enrique Rojas, de acordo com O Globo de hoje. 

Não me surpreende pois são valores muito prezados e em voga atualmente,  à exceção de solteiro. No Brasil, solteirice não dá IBOPE, talvez na Europa...