sábado, 26 de julho de 2025

Terra arrasada.

 Primeiro puseram edifícios/construções abaixo e fizeram de Gaza uma ruina. Agora querem completar o serviço, matando de fome os que não foram abatidos a bala ou pelos bombardeios. É uma infâmia, apesar do Hamas ser infame também. É de doer ver aquelas crianças desnutridas, corpos esqueléticos, rostos macilentos, com aqueles olhos enormes e fundos, à semelhança dos judeus nos campos de concentração nazistas. Dados do Ministério de Saúde de Gaza de junho de acordo com a agência Reuters, controlados pelo Hamas, contabilizavam 55000 palestinos mortos desde o início do conflito, mais da metade de mulheres e crianças. Gaza tem cerca de 2 milhões de habitantes, o que faz do conflito - provavelmente - ser o mais sangrento do século.

Lembrei de Mila 18, um livro de Leon Uris, sobre o ghetto de Varsóvia que lí na minha juventude e que me fez chorar com as atrocidades lá descritas. Lembrei-me do livro, pois o  que os judeus hoje fazem em Gaza, de acordo com as agências internacionais de notícias, assemelha-se muito ao que  os nazistas fizeram com eles no ghetto

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O bicho-homem que foi aquinhoado com a razão pelo  long and widing road da evolução ou por  obra divina definitivamente não aprende a usá-la. Se o fato de sermos racionais e inteligentes levou-nos a produzir  um Sócrates, Aristóteles e Platão na filosofia;  Beethoven, Mozart e Bach na música: Newton, Einstein na ciência, Michelângelo, Da Vinci, Rembrandt e a turma da escola flamenga nas artes plásticas, também nos levou a ser açougueiros uns dos outros a exemplo do genocídio perpetrado pelos nazistas contra os judeus. E agora, por incrivel que pareça, os judeus querem repetir a dose com o povo palestino. Será que não aprenderam nada com a história?


terça-feira, 15 de julho de 2025

Le 14 juillet

Coincidência ou não terminei de ler ontem 1789 - o surgimento da Revolução Francesa de Georges Lefèbvre, Paz e Terra, 3a edição, 2019. De acordo com o título restringe-se ao seu surgimento e a seu ano inicial. A partida é dada pela convocação dos Estados Gerais pelo Rei em maio - sem ela não teria havido a Revolução de acordo com o autor. Prossegue com a revolução parisiense e a tomada da Bastilha (julho), a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão (agosto); o atestado de óbito do Antigo Regime. O último grande acontecimento do ano são as jornadas de outubro com o povo obrigando  Luis XVI a se transferir de Versalhes para as Tulherias em Paris, acompanhado pela Assembléia. As jornadas foram a pá de cal no Antigo Regime pois trouxeram o  Rei e a Assembléia para perto do povo, tornando-os  reféns da Revolução. 

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Diferentemente das Revoluções Holandesa no final do século XVI, da Inglesa que a precedeu em um século e da Americana, sua contemporânea, a Revolução Francesa foi violenta, especialmente nos anos que se seguiram a 1789. As outras  tiveram um caráter reformista, a Inglesa ocorreu em clima tranquilo, foi burguesa e conservadora; a Francesa foi burguesa e democrática sob um ponto de vista de esquerda (Jaurès).  Na Francesa, cerca de cem mil cabeças rolaram aos golpes da guilhotina, na fase da República da Virtude (eufemismo para Terror) de Robespierre, ele próprio uma vítima.

A Francesa foi a mais radical, de um ponto de vista marxista para quem a transição do feudalismo para o capitalismo moderno se fez através de duas vias: a revolucionária, pela  destruição total do antigo sistema econômico e social ou pela via do compromisso que salvaguardava os antigos meios de produção  na nova sociedade capitalista,  de acordo com o posfácio da obra assinado por  Albert Soboul. Na realidade não foi bem assim, pois a igualdade de direitos e não de posses, bem como o direito à propriedade estão lá na Declaração dos Direitos do Homem, para desespero da esquerda mais radical, muito simpática à República da Virtude de Robespierre e seus jacobinos, inspirada em Rousseau.

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Outra maneira de encarar o caráter  revolucionário do movimento francês é o enfoque dado por  Talleyrand : 

O ideal da Revolução Francesa definido desde antes não era uma mera mudança no sistema social francês, mas nada menos do que uma regeneração de toda a raça humana... Eles os revolucionários tinham uma fé fanática em sua vocação - a de transformar o sistema social, raízes e ramos, e de regenerar toda a raça humana. 

Pois é... regenerar a raça humana. Muito revolucionário, muito utópico, mas deu ruim ou como escreveu Hannah Arendt : - Terminou em desastre.

Voltarei ao assunto numa próxima postagem, para comentar a diferença entre os Iluminismos que se desenvolveram na Inglaterra, França e Estados Unidos, assunto de outro livro que estou lendo: Os Caminhos para a Modernidade de Gertrude Himmelfarb, historiadora americana conservadora. A frase de Talleyrand foi extraida de lá.

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Para Lefebvre, um historiador de esquerda, a Revolução foi o somatório de quatro revoluções: aristocratica, burguesa, popular e camponesa, talvez inspirado em Chateaubriand que afirmou que os patrícios começaram a Revolução, os plebeus a terminaram. Os  capitulos iniciais são dedicados à descrição das ordens  em que os 23 milhões de franceses estavam divididos à época: o clero composto por cerca de 100 mil sacerdotes, monges e freiras; os nobres com cerca de 400 mil,  incluiam aqueles de berço, de espada e de toga (tribunais judiciais parisienses e das províncias) e finalmente o Terceiro Estado com o restante da população. Era composto pela burguesia (financistas, banqueiros, negociantes-fabricantes, comerciantes, manufatureiros, médicos, os homens da lei (juizes, procuradores, advogados) e os artesãos com suas corporações) e pelos camponeses, que compunham 3/4 da população, a maioria composta por homens livres. Estes só entraram na Revolução depois do 14 de julho. Até essa data, ela havia sido aristocrática e burguesa. 

Ler nos capítulos iniciais, os privilégios desfrutados pelo clero e pela nobreza da época e as obrigações impostas ao Terceiro Estado em termos de impostos,  transpôs-me à república de privilégios que é o Brasil atual,  produto do patrimonialismo herdado da monarquia portuguesa que sobrevive  até hoje.

E aí entra um terceiro livro que também estou lendo: O País dos Privilégios - Volume 1 : Os novos e velhos donos do poder, de Bruno Carazza, Companhia das Letras, 2024. Nele desfilam os atores do nosso Primeiro Estado - denominação minha - composta pelos donos do poder do setor público: a turma  da toga (magistrados), do parquet (Ministério Público), a elite dos poderes Executivo e Legislativo, os advogados públicos, os fiscais da Receita Federal, a turma da farda, os políticos, os cartórios. Quanto aos atores do Segundo Estado,  encarnados pelos donos do dinheiro e que compõem a classe empresarial o autor reservou o volume II ainda não publicado.

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Os franceses fizeram sua revolução no final do século XVIII, nós continuamos empacados num estágio pré-revolucionário em pleno século XXI. Inacreditável? Infelizmente não. De acordo com dados da Oxfam de 2023, 63% da riqueza do país está na mão de 1% da população; os 50% mais pobres detém apenas 2% dela. 1% da população mais rica ganha 40 vezes mais que os 40% mais pobres de acordo com dados da PNAD contínua do IBGE de 2023. Para chegarmos ao índice de Gini da França de hoje, precisaríamos de 43 anos caso nosso índice evoluísse ao rítmo do período de 2001/2014 conforme dados do IBGE e do Banco Mundial publicados no Poder360.

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Sei não, mas somos um projeto de nação que insiste em dar errado.

segunda-feira, 14 de julho de 2025

O outro lado da cidade (maravilhosa?) (II)

Pois voltei a Madureira. O desfalque - também fui contemplado! - em meu salário do INSS obrigou-me a retornar à capital do subúrbio carioca de acordo com matéria do suplemento sobre Tijuca e Zona Norte  de O Globo do dia 11. Razões históricas determinaram essa distinção para o bairro. A região desde os tempos da Colônia era um entreposto comercial uma vez que o Largo do Campinho era um cruzamento de caminhos indígenas que ligavam Jacarepaguá, Irajá, Pavuna e Méier. O surgimento do Mercadão em 1914 para abastecer a cidade,  foi uma consequência natural dessa posição estratégica, aliada ainda à proximidade com estrada de ferro.

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A viagem desta vez foi menos tensa do que a primeira. Depois das indigestas tratativas com a entidade financeira, dirigí-me ao famoso Mercadão, distante  1000m a pé.  No caminho, uma passarela sobre uma linha férrea, acho que desativada. Toda ela coalhada de ambulantes assim como os seus acessos. Ao longo da linha férrea muito lixo que parece não ser recolhido regularmente. A passarela é travessia para os fortes; advertiram-me que o risco de um assalto era grande; a atmosfera de fato sugeria, mas passei incólume, apesar de ser  alvo das atenções com minha indisfarçável cara de gringo. Alí o Brasil mestiço aparece sem jaça; pretos e pardos dominam a paisagem que sugere um abandono completo do Estado, um daqueles lugares esquecidos por Deus.

Cruzado o Rubicão - ops, a passarela! - andei mais 300m também em calçadas coalhadas por barracas de ambulantes até alcançar  o Mercadão. É um prédio de dois andares que abriga cerca de 600 lojas de acordo com o artigo; muitas delas vendem artigos religiosos,particularmente de umbanda;  outras tantas lembram os velhos armazéns de secos e molhados vendendo grãos, farinhas, azeites; numerosas também são as que vendem utilidades domésticas e quinquilharias com preços acessíveis; havia uma que vendia animais vivos: galinhas e até um cabrito estavam por lá.  A área com verduras e frutas, não  visitei.


Mercadão ontem - 1929 (O Globo)

Mercadão hoje - 2025 (O Globo)

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O Mercadão é a cara do subúrbio; é assim que o carioca denomina os bairros da Zona Norte e Oeste que se desenvolveram ao longo das linhas férreas da Leopoldina e Central do Brasil, um mundo bem diferente daquele da Zona Sul, tanto em termos de lojas quanto de público. Deveria ser ponto de visitação aos turistas que por aqui aportam, e, mesmo para os moradores da Zona Sul que se referem a seus habitantes com uma dose de preconceito. A imensa maioria nunca pisou aquele chão. Não nasci aqui, mas suspeito que o suburbano seja o mais carioca dos cariocas.

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A propósito, lembrei do título de um filme brasileiro - que não assisti -  dos tempos de juventude: Copacabana me Engana . Depois de Madureira e do Mercadão posso dizer:

- Zona Sul me engana!

Uma loja do Mercadão - (O Globo)
Interior do Mercadão (O Globo)

sábado, 28 de junho de 2025

O outro lado da cidade (maravilhosa?)

Ontem o boy aqui, botou os pés na Zona Norte. Fui a Madureira, tentar remediar um golpe aplicado por instituição bancária - a única agência na cidade está lá - no meu salário de aposentado.

Preocupado com minha segurança, coloquei roupas simples e discretas, tentando disfarçar o máximo possível minha condição de forasteiro potencializada pela minha cara de gringo. E lá fui eu de metrô para a Central. Peguei o trem para Japeri; os carros tinham ares de abandono externo, mas eram muito bem cuidados internamente. Pouca gente - eram 8:30h pois o destino ficava no contrafluxo. Bem diferente dos trens superlotados mostrados nos jornais televisivos. Ao longo do trajeto, muitas casas simples e na sua maioria, pouco cuidadas, geralmente de dois andares; atentei para o fato de haver pichação em  muitas delas. Treze estações depois de uma viagem sem percalços, desembarco em Madureira. 

Para sair da estação de trem e alcançar a rua, enfrenta-se duas longas escadas e um corredor atopetado de barracas de ambulantes. Nada de escadas rolantes. Ví idosos subindo e descendo por elas penosamente. Nas ruas de calçadas estreitas, muita gente,  vestida simplesmente; a maioria pardos e pretos.

A agência bancária estava próxima, e com uma razoável fila para o atendimento, composta por muitos idosos - possivelmente aposentados - de condição muito simples. As histórias que ouvi, dos que  estavam próximos, deixava transparecer a condição precária das suas vidas, tanto físicas quanto monetárias. Vinham de outros bairros, um deles com problemas de coluna, tinha dificuldade para ficar de pé.   Todos com histórias de dívidas e empréstimos, contraídos sei lá com que cláusulas, pela instituição bancária que,  se tinha aplicado um golpe em alguém da minha condição, imagina o que poderia ter aprontado pra cima  desse pessoal. Senti a grandeza do meu privilégio,  num país multifacetado como o nosso, vendo aqueles rostos vincados pela dureza da vida, potencializada por suas condições financeiras. Ouvi poucas queixas. Por incrível que pareça, observei um tom de resignação e até mesmo de  aceitação da sua condição. 

Já no interior da agência, aguardava minha vez sentado numa das muitas cadeiras que acomodavam aquele resignado exército Brancaleone. Volta e meia aparecia um funcionário sorridente e com uma gentileza afetada, oferecendo um cafezinho bem quente. Parecia deboche, e era!  Não faltou o toque evangélico. Lá pelas tantas alguém ergue uma Bíblia e entoa um  - Glória a Deus!

Fui atendido depois de uma hora - tempo razoável dentro das circunstâncias! - e voltei para a minha condição privilegiada de morador da Zona Sul prometendo retornar para uma visita ao Mercadão de Madureira, um velho sonho. Deram-me uma dicas de como chegar lá. Dá para ir caminhando a partir da estação de trem e isso me deu ânimo para uma nova visita ao outro lado da cidade. Talvez mais raiz daquele em que habito.




quarta-feira, 25 de junho de 2025

Vivendo o seu sonho.

Foi argumento frequentemente utilizado para justificar a aventura da moça de Niterói que morreu tragicamente na Indonésia ontem. Comumente utilizado quando se questiona os riscos envolvidos na aventura e o conhecimento a respeito deles pelas pessoas decididas a fazê-la. Todos são unânimes em afirmar de que se trata de uma trilha com grau de dificuldade elevado, não apenas pela geografia do terreno, mas também das condições de clima, preparo dos guias, além da falta de informação ou falsa informação a respeito da aventura. Prefere-se, entretanto, jogar prá baixo do tapete as verdades inconvenientes e louvar o espírito aventureiro daqueles que o fazem.

Viver o seu sonho fica bem na boca de um adolescente, mas na boca de um adulto, de um educador deveria ser sempre seguida de uma adversativa. Tentar realizar um sonho sem estar equipado para alcançá-lo ou quando as condições são francamente adversas é temerário e pode ser fonte de frustrações, quando não de tragédias. Para cada João Carlos Martins -  pianista e maestro que hoje completa 85 anos e um dos maiores intérpretes de Bach no mundo, e que chegou lá mesmo após ter perdido o movimento das mãos devido a uma doença rara - quantos ficam pelo caminho? 

Entretanto, argumentar com o viver o seu sonho,  vai te dar um carimbo de cara legal, otimista, que acredita na força do ser humano, além de elevar teu conceito no círculo engagé. Difícil é pontuar os riscos da aventura, posição mais responsável e adulta. Entretanto, vivemos em um mundo infantilizado como pontuou Amós Oz em uma entrevista para a Folha .

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Uma pessoa próxima tem uma filha que deseja ser médica e já se foram  3 anos tentando passar em vestibular de universidade pública sem sucesso. Universidade paga não pode cursar,  porque implicaria em investimento financeiro que a família teria dificuldade para custear. E aí...vai continuar a viver o seu sonho já tendo perdido  anos de vida profissional?

segunda-feira, 16 de junho de 2025

Quero desconhecer gente que já conheço.

Sei lá se é a velhice, mas cresce em mim o desejo de ficar em casa, com meus livros, minhas comidas, meus vinhos. Estou repetindo minha mãe que sempre dizia que ficava bem em casa, no seu arrevesado dialeto, mescla de italiano falado no Trentino-Alto Adige e português. Até meu pai, mais sociável, na sua velhice, preferia a traquilidade do lar. Gostava de receber os netos, mas quando eles iam embora dizia: - Graças a Deus! Maior seu avanço nos anos, menor sua tolerância para com a agitação.  

Com tal genética, eu fui além. Antissocial-raiz, quero desconhecer gente que já conheço, como escreveu Lusa Silvestre na sua coluna do Estadão. Interagir com os outros, cada vez mais, torna-se uma agonia. Repetindo minha mãe:

- Fico bem em casa.

quinta-feira, 12 de junho de 2025

...mais anos 60, impossivel!

 Paul McCartney afirmou em 1974 que God Only Knows foi a maior música pop já escrita. Deve ter sido um arroubo do momento, mas que ela exala o aroma dos sixties e de um mundo que parecia se abrir,  ah... isso é!


... e existe essa deliciosa versão da BBC, com muitos figurões do rock/pop e apenas Brian Wilson dos Beach Boys.



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In memoriam  a Brian Wilson (1942-2025).
Caramba! Todos estão a se ir...