quarta-feira, 25 de setembro de 2013

Consciência... prá que te quero? (2)

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O mais interessante de Jobs, filme de Joshua Stern sobre o criador da Apple, está no que consegue mostrar da pura brutalidade, verbal e moral, que parece prevalecer no mundo corporativo. 
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A julgar pelo filme, ele era antes de tudo um monstro. Desde sua entrada no mundo da informática, desenvolvendo aqueles joguinhos primitivos de Atari, Steve Jobs grita, humilha, apunhala e pisoteia quem passa pela sua frente.

Sua primeira negociação, com o proprietário de uma lojinha de acessórios eletrônicos, já se apresenta como duvidosa, para dizer o mínimo. Jobs mente, ou blefa, a respeito de suas possibilidades como fornecedor de um novo tipo de aparelho --no qual, mente de novo, inúmeras outras lojas estavam interessadas.

O aparelho, claro, é um modelo de computador que se pode usar dentro de casa, acoplado à tela de TV. A genialidade técnica da invenção não proveio de sua mente autocentrada, cujo caráter visionário e persistente se confunde com os defeitos do açodamento e da cegueira.

Ele percebeu que o mundo poderia ser outro, se surgisse alguém capaz de saber o que o consumidor deseja, antes mesmo que esse desejo fosse percebido.

O preço a pagar durante o caminho é de não ver mais nada, nem ninguém, entre o primeiro passo e o objetivo final. Jobs ignora tudo --até a namorada grávida e depois a própria filha-- em favor desses aparelhos que, por sua vez, tanto nos ajudam a conhecer e a ignorar o mundo.

Isso seria o de menos, não fosse a presença de outros humanoides tão determinados e impiedosos quanto ele. São os que terminam por destituí-lo da própria empresa. Jobs só era suportável se desse lucros aos acionistas; mas sabemos de que modo as novas tecnologias têm o poder de emperrar e não dar certo.

Quando ele volta para a Apple, supostamente mais humano e sábio, o espectador já está farto de torcer por um sujeito tão detestável. O próprio Jobs se deixa amolecer, e os produtos da empresa começam a ganhar a aparência que têm hoje. 
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Marcelo Coelho - Folha, 25.09.2013
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Já tinham me falado desse filme e das patranhas que o Jobs armara prá chegar lá - o objetivo final a que se refere o texto. Veio-me a lembrança um video que rodou na Internet, logo após sua morte, com  um discurso que ele fizera a formandos de uma dessas universidades da Ivy League. Impressionou-me. Era fantástico. Repassei-o, inclusive. Depois... esse filme.  Mostra bem como é importante chegar lá. Não importam os meios. Se você é alguém de sucesso, o rei da cocada preta, um winner enfim... você  legitima seu discurso, seus atos, sua pessoa. Você é o cara. Adquire o respeito dos outros. Não o meu. Só acredito no que as pessoas fazem; no que dizem, definitivamente não. Ainda mais nos tempos marqueteiros em que vivemos onde a imagem é que importa.

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