terça-feira, 6 de julho de 2021

O primeiro ano do que me resta da vida

E lá se foi um ano de aposentadoria. Parafraseando a tradução brasileira - O primeiro ano do resto de nossas vidas - para St. Elmo's Fire, filme icônico dos anos 80,  este foi o primeiro ano do último capitulo da minha vida. O que dela restou. Quanto durará? Não faço idéia, mas uma estranha premonição sugere que não será longa. Na velhice fazemos um acerto de contas com nossa vida passada. A minha em termos de saúde não é das mais recomendáveis, logo não devo esperar muito. Dai que estou começando a fazer as malas.

Longe de ser entediante como muitos anteviam, - mesmo confinado devido à pandemia -  foi um ano de emoções nunca vividas in house. Não contando com os préstimos da secretária, virei um self-made man das tarefas domésticas, lavando, passando, faxinando, cozinhando... Meter a mão na massa me fez compreender o quanto são demandantes os afazeres domésticos e de experimentar na carne o eterno retorno nietzchiano e o Míto de Sísifo grego. Você limpa e logo está sujo. É um círculo infernal, incompreensível para quem nunca esteve envolvido com a atividade de limpeza. Agora entendo a verdadeira obsessão que as mulheres tem para manter limpa a pia da cozinha.

Se não houve tédio, um sentimento de profunda melancolia brotou especialmente nos últimos meses. Com as portas para o futuro fechando-se, restou estender os olhos para a amplidão do passado. Enquanto lavava o banheiro, fermentava o pão, passava meus lençóis, colocava a roupa branca para quarar na pequena sacada ... voltei meus olhos para os feitos e desfeitos dos meus 69 anos de vida. Sim, houveram alegrias, batalhas vencidas mas não são elas que te marcam. São as derrotas e os fracassos ... as escolhas erradas, o auto-engano sem medida,  os amores que escorreram pelo ralo...

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Reviver meu passado, cristalizou minha condição de homem sem qualidades que já havia definido como um dos atributos no meu perfil deste blog

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Tanto desencanto, talvez seja reflexo das minhas últimas leituras:

- Diário de um homem supérfluo de Ivan Turguêniev (Editora 34); uma novela dos últimos dias da vida marcada por um amor não-correspondido de um jovem da pequena nobreza russa. 

- Stoner de John Williams (Editora Radio Londres); um romance sobre a trajetória da  vida de  um professor universitário americano entre 1910/1950.

Identifiquei-me com os dois personagens centrais. São trágicos,  terminam seus dias melancolicamente. Você não conclui a leitura de nenhum dos livros sem um travo amargo na boca, ou se mais emotivo, com pelo menos uma lágrima furtiva nos olhos. 

Definitivamente não são livros fofinhos, tampouco para serem lidos por fofos.

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