...é o que teria postado nas redes o protético matogrossense Felipe Cisneros, enquanto participava da invasão e depredação das sedes dos Três Poderes no domingo que passou. Está na coluna de Bernardo Mello Franco para O Globo de 11.01.
A frase chamou minha atenção para algo que passa desapercebido pela midia, preocupada em qualificar o furdunço em golpe, ato terrorista, em caracterizar os manifestantes como baderneiros, golpistas, fascistas, destruidores do patrimônico cultural do país. Quem estava lá eram os manés, o povão. Não deve haver pesquisa sobre os perfis dos baderneiros mas pelo que lí, vi e ouvi a maior parte parece ter vindo do interior do país... do Centro-Oeste, São Paulo, eram classe média-média, média-baixa. Raros devem ter curso superior. Não eram elite de coisa alguma... cultural, econômica, política, intelectual... . Eram o Brasil profundo, sem movimentos sociais que os representem, invisíveis para a midia. Felipe Cisneros, que viajou da distante Cáceres, na fronteira com a Bolívia é o protótipo perfeito dessa turba.
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Sei lá por qual razão, veio-me à cabeça uma crônica - impagável - que Nelson Rodrigues fez da célebre passeata dos Cem Mil promovida por estudantes e artistas em 1968. Abaixo alguns trechos transcritos do site Aventuras na História:
E outra observação que me deu o que pensar: - os Cem mil tinham uma saúde dentária de anúncio dentifrício. (...) E a marcha de 100 mil sujeitos sem uma cárie, sem um desdentado, assumia a forma de um pesadelo dentário (...) “E o povo? Onde está o povo?” O povo era ausência total. Não havia uma cara de povo, um paletó de povo, uma calça de povo, um sapato de povo.”
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Dois momentos emblemáticos que mostram a distopia que somos como país; eu diria que ela não é privilégio nosso mas da maior parte dos países da América Latina. Em um deles está na rua o povão, e quem diria representando o que se convencionou chamar de direita do país, a mais retrógrada; noutro, sem nenhum sinal de povo, a nossa assim chamada esquerda. Vai entender...
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Traz alguma luz sobre o problema, embora não o explique, uma frase de Gabriel Boric, presidente chileno - parece-me alguém da esquerda inteligente e arejada latino-americana, espécime raro em Pindorama - em entrevista publicada na Folha:
Uma pergunta que temos que nos fazer como esquerda é por que, em que momento, a ideia da rebeldia foi apropriada pela direita no mundo.
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Eu faria mais uma:
Como explicar a direita associada ao povão e a esquerda às elites como mostram os dois episódios da nossa história recente?
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