sábado, 20 de novembro de 2021

Milicianos da linguagem.

Em 1976, Cacá Diegues denunciou as patrulhas ideológicas, rebatendo as criticas endereçadas por certos setores puristas da esquerda a seu filme Xica da Silva

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Hoje há patrulhas - milícias, termo mais apropriado para nossos tempos - ativas, para todos os gostos. Vou ficar com a que se dedica à linguagem. Os ativistas de raça e gênero em especial, estão extremamente atentos à carga histórica associada ao vocabulário que utilizamos. 

São muitas as palavras incluídas no index carga histórica pesada. Cuidado, por exemplo, com o uso de palavras como judiar e mulato. Melhor não empregá-las em ambientes progressistas pois certamente o carimbo de antissemita ou racista será colocado na sua testa. Não conta a intencionalidade. Passa pela tua cabeça que Zeca Pagodinho seja antissemita por ter escrito o samba Judia de Mim? Ou que Martinho da Vila que cantava o refrão salve a mulatada brasileira na década de 70 seja racista? 

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É muito excesso de zelo, beligerância barata,  considerar ofensivo o uso de palavras como mulato e judiar, e a partir daí, carimbar pessoas pelo fato de as terem utilizado na maior parte das vezes por desconhecimento, distração ou sem segundas intenções. O caráter ofensivo de uma palavra  depende muito do contexto em que é usada e da intenção da pessoa que a usa. A turma do barulho, entretanto, advoga que basta sentir-se ofendido para estar com a razão. No que me toca, é fácil perceber quando alguém me chama de velho se o faz  com afeto ou maldade.  O patrulheiro - ops! miliciano -  não quer saber, passa a régua. E como os fins justificam os meios, considere-se um felizardo, se além disso você não acabar sendo alvo de cancelamento ou lacração. 

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Seria a linguagem um palco para lutas políticas como escreve Sergio Rodrigues no seu artigo para a Ilustríssima de 28.11?  Fico com a opinião - um pouco encima do muro! -  do linguista John McWorther, por ele citado,  de que a  linguagem não molda o pensamento da maneira como se supõe, mas que palavras podem empurrar idéias para certas direções. O exemplo que ele propõe, considero bem razoável: ao invés de usar escravo - substantivo  que denota condição essencial -  mais adequado seria o uso de escravizado - adjetivo que denota contingência. 

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É mais um capítulo da guerra cultural que a esquerda deflagrou na segunda metade do século passado, que está tendo a resposta da direita neste século. Não sou otimista quanto ao seu desfecho. 

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Fico aqui pensando se terei que abolir do meu vocabulário palavras como denegrir e esclarecer. Elas ainda não foram incluidas no index, mas estão fazendo força para tal.

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