...é minha secretária - eufemismo criado pela consciência culpada da classe média para empregada - Lurdinha*. Com as taxas de vacinação assumindo valores que permitem uma maior circulação das pessoas ela voltou a trabalhar duas vezes na semana. Aposentado, fico mais tempo em casa e com isso as possibilidades de trocar uma ideia com ela aumentaram. Ontem ela saiu-se com essa:
- Se eu fosse bonita, trabalharia como prostituta.
Até aí tudo bem, afinal ela é de maior, vacinada e dona do seu nariz. O detalhe é que - pelo menos nas aparências - ela é terrivelmente evangélica. Enquanto trabalha, é comum ouvi-la cantando hinos religiosos. Conheço pouco de Nelson Rodrigues, mas certamente a Lurdinha deve estar retratada em alguma das suas personagens. Se não, certamente poderia ser considerada uma delas.
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Ontem ajudei-a a limpar as estantes da minha biblioteca e caiu-me à mão um dos livros de Nelson: Meu Destino é Pecar. Mostrei-o e sugeri, em tão de blague, sua leitura. Ela olhou-me com um olhar maroto, quase aceitou mas acabou recusando, com o argumento de que não gosta de ler. Depois acabou levando um livro com poucas páginas de Epicuro sobre a felicidade e - pasmem! - outro livro pequeno composto por aforismos do José Maria Escrivá, fundador da Opus Dei, que tinha ganho de um amigo meu, militante da causa. Não é tudo muito rodrigueano?
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* Nome fictício.
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